Sportswashing é o novo pão e circo

O futebol e o esporte mundial não são mais os mesmos, e tudo tem a ver com dinheiro; saiba tudo sobre o sportswashing

No cenário global, o esporte sempre foi uma ferramenta poderosa para unir pessoas, celebrar conquistas e exaltar o talento humano. No entanto, nos últimos anos, uma prática preocupante tem ganhado força: o sportswashing. Esse termo, relativamente recente, refere-se à estratégia utilizada por países e corporações para melhorar sua imagem internacional e desviar a atenção de questões controversas ou problemas internos, utilizando o esporte como fachada. Mas, por que isso deveria nos preocupar?

Vamos olhar para exemplos concretos. Países com históricos problemáticos em direitos humanos, como a Arábia Saudita e o Qatar, têm investido pesadamente em eventos esportivos de grande porte e em clubes de futebol mundialmente renomados. A ideia é simples: associar-se a grandes nomes e competições de prestígio para suavizar a percepção negativa de sua governança interna e políticas sociais.

Tomemos o Qatar como exemplo, sede da Copa do Mundo de 2022. Desde a confirmação do país como anfitrião, inúmeras denúncias surgiram sobre as condições de trabalho dos imigrantes responsáveis pela construção dos estádios. Foram reportadas mortes, jornadas extenuantes e condições análogas à escravidão. No entanto, o espetáculo do futebol mundial se desenrolou em meio ao brilho e ao glamour, deixando essas vozes à margem. A pergunta que fica é: vale a pena celebrar um evento enquanto vidas são sacrificadas pelo entretenimento global?

Qatar 2022 proves that sportswashing works - New Statesman
Seleção da Alemanha | Foto: Getty

O caso da Arábia Saudita também merece destaque. Com a compra do Newcastle United e a criação da Saudi Pro League, o país busca moldar uma nova narrativa, dissociando-se das críticas sobre a repressão política, a falta de liberdade de expressão e a situação das mulheres no país. Utilizando o poder do futebol, o governo saudita tenta transformar sua imagem, atraindo estrelas do esporte e realizando grandes eventos esportivos que desviam a atenção das questões internas.

Sportswashing, porém, não se limita apenas a esses países. Corporações e até mesmo indivíduos têm adotado essa estratégia. Marcas envolvidas em escândalos ambientais, trabalhistas ou financeiros patrocinam grandes eventos esportivos, na tentativa de limpar sua imagem e conquistar a simpatia do público. É um jogo de aparências, onde o esporte, um dos elementos mais puros e unificadores da sociedade, é usado como uma ferramenta de marketing e manipulação.

O que torna essa prática tão preocupante é a sua eficácia em encobrir realidades duras com o manto do entretenimento. Quando assistimos a um jogo de futebol, nos envolvemos na paixão, nas disputas, na habilidade dos jogadores. Mas, ao mesmo tempo, podemos estar sendo complacentes com governos e empresas que utilizam o esporte para desviar a atenção de práticas condenáveis.

O sportswashing nos coloca em uma posição desconfortável. Como fãs de esporte, queremos nos perder na beleza do jogo, nos emocionarmos com as vitórias e nos unirmos em torno de uma paixão comum. Mas, ao mesmo tempo, devemos questionar: a que custo estamos desfrutando desse espetáculo?

Não é errado apreciar o esporte, mas é essencial mantermos uma consciência crítica sobre quem está por trás dos grandes eventos e quais são suas motivações. O futebol, assim como qualquer outro esporte, deve ser um campo de justiça, igualdade e celebração do talento humano, e não uma cortina de fumaça para encobrir violações e injustiças. O verdadeiro espírito esportivo exige transparência e integridade, valores que não podem ser sacrificados no altar do poder e da imagem.

É hora de olhar além do campo e questionar quem realmente ganha com o espetáculo. Será que estamos celebrando o esporte, ou sendo coniventes com a manipulação de sua essência?

Cristian Bessone

Editor do Sports Context

Jornalista em formação pela Unesp Bauru.

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